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Othon Luiz Pinheiro da Silva sab, 15/07/2017 - 12:06 Do Zero Hora http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2017/06/de-pai...

sábado, 15 de julho de 2017



Othon Luiz Pinheiro da Silva



Do Zero Hora
De pai do programa nuclear à prisão: quem é o vice-almirante que chefiou ações secretas e corrupção estatal

Othon Luiz Pinheiro da Silva comandou esquema criminoso em Angra 3 e recebeu a maior pena em um só processo entre condenados na Lava-Jato
Por: Fábio Schaffner

30/06/2017 - 19h58min | Atualizada em 03/07/2017 - 14h38min
 
 quem é o vice-almirante que chefiou ações secretas e corrupção estatal ALAOR FILHO/AGENCIA ESTADOAclamado no meio científico, engenheiro naval viveu thriller de espionagem nos bastidores do poder Foto: ALAOR FILHO / AGENCIA ESTADO
Em 40 anos servindo à Marinha, o vice-almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva tarimbou-se em operações sigilosas. Mentor do programa nuclear brasileiro durante quatro governos sucessivos, gerenciou contas secretas bilionárias, manteve contatos reservados com cientistas estrangeiros, importou equipamentos vetados ao Brasil por potências atômicas e foi monitorado por agente da CIA que, durante dois anos, morou em um apartamento colado ao seu.

Tamanha eficácia legou ao país a construção de ultracentrífugas para o enriquecimento de urânio e o desenvolvimento de uma tecnologia nacional para a propulsão nuclear de submarinos. Aclamado pelas Forças Armadas e pela comunidade científica, recebeu oito medalhas militares e dezenas de honrarias. Chamado de lenda viva na caserna e na academia, encerrou a carreira em 2015, quando três homens armados entraram em sua casa.
O relógio recém marcara 6h em 28 de julho, e o sol ainda despontava no horizonte quando uma viatura da Polícia Federal (PF) estacionou em frente ao número 75 da Rua Ipanema, uma alameda da Barra da Tijuca, no Rio, distante poucas quadras da praia. Subiram ao apartamento 1.501 e foram recebidos pela empregada doméstica Kelly Guimarães, a quem perguntaram pelo dono da casa.
— Está dormindo — disse.
Orientada a acordá-lo, voltou à sala com semblante petrificado. Quando os policiais se dirigiram ao cômodo, a porta estava trancada. Lá de dentro, Othon avisou que era vice-almirante e exigia ser tratado com respeito. Alertado de que
havia mandado de busca e apreensão a ser cumprido, exigiu a presença de um almirante, posto superior ao seu na hierarquia militar.
— Vou meter bala — ameaçou Othon.
Abrigados nos demais cômodos do amplo apartamento, os agentes sacaram as pistolas. Chefe da operação, o delegado Wallace Soares deu dois chutes na porta e disse que iria arrombá-la. Ouviu-se então o barulho da fechadura. Othon recebeu ordem para sair devagar com as mãos na cabeça. Mal se abriu um pequeno vão, o militar atracou-se aos agentes.
A pancadaria só acabou com o vice-almirante algemado, sentado ao chão.  Como chefe da Eletronuclear, criou esquema de corrupção em Angra 3

"Mesmo imobilizado, o senhor Othon Luiz Pinheiro da Silva continuou inquieto, gritando que não podíamos agir daquela forma, que ele é um vice-almirante da Marinha, que deveria haver no mínimo um vice-almirante no local. Expliquei novamente que se tratava de um mandado expedido pela Justiça do Paraná e que Polícia Federal estava no local para cumpri-lo", escreveu o delegado em relatório para a coordenação da Lava-Jato.

No quarto, os agentes apreenderam seis armas: uma pistola .40 e um revólver calibre 38, em nome do militar, além de um revólver Colt 357, um pistola Glock 9 mm, um Taurus 38 e uma pistola Bayard calibre 6.35, todas sem registro. O mandado decretava ainda a prisão temporária de Othon, por suspeita de recebimento propina na usina nuclear Angra 3.

Aos 76 anos, militar presidia a Eletronuclear desde 2005. Havia sido um retorno triunfal. À frente de posto estratégico e de orçamento bilionário, Othon jamais desfrutara de tanto poder. Frequentava o Planalto com assiduidade, confabulava com ministros e presidentes de empreiteiras. Indicou dois comandantes da Marinha e tornou-se amigo de Dilma Rousseff, de quem quase foi chefe da Casa Civil após a demissão de Gleisi Hoffmann, em 2014.

Na Eletronuclear, sua missão foi retomar as obras de Angra 3, colosso energético projetado para gerar 12 milhões de megawatts-hora por ano, capacidade suficiente para abastecer Brasília e Belo Horizonte. Para tanto, evitou uma nova licitação e reativou um antigo contrato assinado em 1983 com a Andrade Gutierrez. De 2005 a 2015, Othon assinou 13 aditivos com a construtora, no valor de R$ 3 bilhões.

Ao mirar o setor energético, a Lava-Jato encontrou na estatal um "gigantesco esquema criminoso", envolvendo um cartel formado por 16 construtoras, entre as quais gigantes como OAS, Odebrecht, Camargo Corrêa e Mendes Júnior. Presos, executivos disseram que Othon teria começado a pedir propina antes mesmo do começo das obras na usina. Com uma das filhas, foi acusado de montar esquema de lavagem de dinheiro para receber R$ 4,5 milhões em suborno, com empresas laranjas no Brasil e offshores no Exterior.

Condenado por seis crimes, nega as acusações e recorre no TRF2

Em agosto de 2016, um ano após ter a casa varejada pela PF, Othon recebeu a maior pena individual entre os todos 144 condenados na Lava-Jato: 43 anos, cinco meses e 50 dias. Ao final das 159 páginas em que descreve os crimes cometidos por Othon, o juiz federal Marcelo Bretas considerou-o culpado por corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa, evasão de divisas e embaraço à investigação. Para o magistrado, o militar, "portador como poucos de segredos de Estado num tema que sempre foi muito caro às maiores potências mundiais, abriu mão de sua honrada história de estudos e trabalhos à nação brasileira para obter vantagens indevidas, agindo com desprezo pela instituição que o acolheu com honras de chefe máximo."

Othon recorreu ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Nega as acusações e disse que o dinheiro recebido de empreiteiras financiaria projeto de turbinas para gerar energia a partir de pequenas quedas d'água.

Mestrado em Engenharia Nuclear pelo MIT

Em 1974, o ministro da Marinha, Geraldo Henning, estava fascinado pela tecnologia nuclear. Recém chegado de um viagem da Bahia ao Rio em um submarino atômico americano, relatou a experiência ao almirante Eddy Espellet. O interlocutor revelou que havia designado um capitão-de-corveta para acompanhar, no Reino Unido, a construção de submarinos Tonelero. Sugeriu então enviar o jovem Othon Luiz Pinheiro da Silva, em quem enxergava "liderança, iniciativa e entusiasmo", para estudar o tema nos Estados Unidos.

Ao retornar, quatro anos depois, Othon lustrava o currículo com mestrado em Engenharia Nuclear pelo prestigiado Massachusetts Institute of Technology (MIT). Mas a Marinha não sabia o que fazer com ele. Na semana seguinte ao desembarque, foi levado à sala do diretor-geral de Material da Marinha, almirante Maximiano da Fonseca.

— Você, que cursou esse negócio, quais as nossas chances de ter uma produção nuclear aqui no Brasil? — perguntou o oficial.

Líder de pesquisas militares, Othon geria contas secretas do governo

Othon pediu três meses para produzir um relatório. Findo o prazo, entregou um calhamaço no qual sugeria a criação de um programa para dominar o ciclo do combustível nuclear — tema de sua dissertação de mestrado no MIT — e a propulsão atômica de submarinos. A apresentação selou seu destino. Pelas duas décadas seguintes, presidiu diversos órgãos militares e civis, sempre dirigindo todas as pesquisas nucleares do governo.

— O papel do vice-almirante Othon é central no programa brasileiro de enriquecimento de urânio com ultracentrífugas. Criou novos materiais, geometrias, a divisão de cada componente. É uma tecnologia conhecida, faz parte do inconsciente coletivo científico. Mas há diferença entre saber que é possível fazer e efetivamente fazer. Ele fez — diz o pesquisador da USP Alexandre Ramos, pós-doutor pela Stony Brook University, de Nova York e autor de estudos de fissão-fusão nuclear.

Cortejado por cientistas, Othon viveu trajetória de thriller de espionagem. De 1983 a 1986, administrou uma das quatro contas secretas mantidas pelo governo para custear o programa nuclear. Para proteger o dinheiro da inflação, tinha aval do próprio presidente João Figueiredo para investir no overnight — aplicação renovada diariamente — e garantir correção monetária. A existência das contas foi revelada pela jornalista Tânia Malheiros, autora do livro Histórias Secretas do Brasil Nuclear. Segundo Tânia, a conta denominada Delta IV era usada por Othon para "pagamentos suplementares, espécie de caixa 2 do pessoal da máxima confiança da Marinha".

Nos anos 1990, Othon se valeu da Guerra do Golfo para obter equipamento fundamental a suas pretensões. O Iraque havia encomendado à Alemanha uma máquina de última geração para produzir ultracentrífugas de fibra de carbono. Com a invasão do Kuweit pelos iraquianos, a entrega foi cancelada, e Othon convenceu um técnico alemão a vender a tecnologia. Em 1996, dois dias após o lançamento do livro de Tânia, Karl-Einz Schaab foi detido pela Polícia Federal porque havia mandado de prisão contra ele expedido pelo Supremo Tribunal Federal a pedido do governo alemão.

Expedientes heterodoxos levaram à aposentadoria a contragosto

Apesar dos avanços científicos, os métodos do vice-almirante incomodavam a Marinha. Sem autorização dos superiores, em 1993 ele contratou duas empresas chefiadas por oficiais da ativa e da reserva que colocaram mais de 400 pessoas trabalhando em projetos especiais da corporação.

Logo após a contratação, desconfiou que estava sendo monitorado por um casal que vivia rondando sua casa, em São Paulo. Não teve dúvidas. Dirigiu-se ao carro onde a dupla estava e colocou uma pistola na cabeça do motorista. Eram o cabo Marcelo Ferreira Miranda e a segundo-sargento Kátia de Assis Guimarães, que investigavam Othon por ordem do Centro de Inteligência da Marinha.

Na mesma época, o oficial esteve na mira do serviço secreto americano. Morava no apartamento 191 de um prédio no bairro dos Jardins. Logo abaixo, no número 181, vivia Ray H. Allard, oficialmente um agente de informações do consulado dos Estados Unidos na cidade. Relatório confidencial da Marinha diz que Allard desocupou o imóvel em 26 de julho de 1994. "Seu retorno pode ter objetivo de eliminar provas do constrangimento que causou" a Othon, diz o documento.

Havia intrigas demais na caserna, e o vice-almirante acabou retirado de cena. Ganhou do presidente Itamar Franco a Grã Cruz da Ordem do Mérito Científico Nacional e foi mandado para casa pelo ministro da Marinha, Ivan Serpa. Na reserva a contragosto, escondeu centenas de documentos, entre os quais contratos, detalhamento de despesas e planilha na qual contabiliza ter gasto US$ 668 milhões no período em que liderou o programa nuclear.

Revoltado com o expurgo revestido de homenagem, prestou concurso para retornar à Comissão Nacional de Energia Nuclear. Tirou primeiro lugar, mas jamais foi nomeado. Othon só voltaria a ter destaque no programa nuclear brasileiro com o convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir a Eletronuclear em 2005. Hoje cumpre pena em uma base da Marinha em Duque de Caxias.
 

Othon apresenta currículo respeitável
Formação acadêmica
— 1960 — Oficial de Marinha do Corpo da Armada
— 1966 — Engenharia Naval. Cursou simultaneamente as especialidades de Arquitetura Naval e Máquinas
— 1978 — Mestrado em Engenharia Mecânica pelo MITAtuação profissional— Atingiu o posto de vice-almirante no corpo de engenheiros e técnicos navais, o mais alto posto da carreira naval para oficiais engenheiros.

— Fundador e responsável pelo programa de desenvolvimento do ciclo do combustível nuclear e da propulsão nuclear para submarinos de 1979 a 1994.

— Autor do projeto de concepção de ultracentrífugas para enriquecimento de urânio.

— De 1982 a 1984 foi diretor de pesquisas de reatores do Ipen.

— Autor do projeto de concepção da instalação de propulsão nuclear para submarinos brasileiros e do reator de teste, protótipo de terra dessa instalação.

— Coordenador de projeto e desenvolvimento dos laboratórios de grande porte, necessários à validação experimental de equipamentos e componentes do sistema de propulsão nuclear para submarinos, assim como projeto e desenvolvimento desses equipamentos e componentes e sua fabricação na indústria brasileira.

— Diretor-presidente da Eletrobras Eletronuclear.

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Há 75 anos, sniper ucraniana venceu o machismo e o nazismo na 2ª Guerra Mundial

Protagonista de uma geração, a jovem Lyudmila Pavlichenko lutou contra o preconceito e se transformou na melhor sniper da história, matando quase 500 soldados nazistas em menos de 6 meses
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O machismo poderia ter impedido a vitoriosa carreira militar da jovem de 24 anos - Foto: Reprodução
O machismo poderia ter impedido a vitoriosa carreira militar da jovem de 24 anos - Foto: Reprodução
"Você deveria ser enfermeira." Esta frase foi dita aos risos por um alto oficial do Exército Vermelho à ucraniana Lyudmila Pavlichenko, em 1942. Graças a sua determinação, mesmo numa época que o machismo era escancarado, a jovem lutou pelos seus ideais e conseguiu se alistar na infantaria soviética.
Meses depois, ela se tornaria a melhor mulher sniper da história e seus recordes permanecem imbatíveis ainda hoje.
O machismo poderia ter impedido a heroica carreira militar da garota de 24 anos, que foi a responsável pela morte de aproximadamente 500 nazistas, sendo 309 reconhecidas oficialmente. Ela ainda abateu 36 snipers alemães. Sua fama pela pontaria certeira a transformou rapidamente numa lenda dentro da União Soviética e foi tratada como uma heroína de guerra até sua morte, em 1974.
Em 1942, durante a 2ª Guerra Mundial, Lyudmila estudava História, na Universidade de Kiev, quando decidiu se alistar no Exército Vermelho. No momento que foi se registrar houve uma tentativa dos oficiais soviéticos direcionarem a sua inscrição para o setor de enfermagem, mas ela não aceitou a coação e manteve a posição de se recrutar na infantaria. O ato machista destoava da posição oficial do exército da URSS que manteve ao longo dos combates aproximadamente duas mil atiradoras de elite em seus campos de batalha. Ao final da guerra somente 500 destas mulheres sobreviveram, incluindo Lyudmila Pavlichenko.
Antes de ser ferida com os estilhaços da explosão de um morteiro nazista, em junho de 1942, Lyudmila lutou por quase três meses em Odessa, na Ucrânia. Somente neste período, a sniper matou 187 soldados nazistas. Quando a cidade foi tomada pelos alemães, o seu batalhão precisou recuar estrategicamente até a Península da Crimeia. Nas semanas posteriores ao recuo, ela ainda acertou outros 300 nazistas, incluindo aproximadamente 100 oficiais de Hitler. No final do ano, já recuperada dos ferimentos, ela foi enviada aos Estados Unidos e Canadá para uma visita oficial aos governos destes países. Lyudmila foi a primeira representante soviética a ser recebida por um presidente norte-americano. Na época, ela foi recepcionada por Franklin Roosevelt e Eleanor Roosevelt, que se transformaria num símbolo da luta pela igualdade de gêneros no mundo.
Com uma pontaria certeira, Lyudmila usava um rifle de longo alcance semiautomático. A arma preferida da jovem era a espingarda Tokarev SVT-40, famoso armamento soviético usado durante a 2ª Guerra Mundial. Na função de sniper, a excelente pontaria e uma boa arma são importantes, mas o principal é esperar o inimigo de forma paciente. Relatos de colegas da época afirmam que a ucraniana permanecia até incríveis 18 horas imóveis à espreita de soldados do Eixo. Sua atuação cirúrgica foi considerada fundamental para barrar o avanço nazista na Europa, na metade da guerra.
Quando foi se alistar houve uma tentativa dos oficiais direcionarem sua inscrição para o setor de enfermagem, mas ela não aceitou a coação e manteve a posição de se recrutar na infantaria - Foto: Reprodução
Quando foi se alistar houve uma tentativa dos oficiais direcionarem sua inscrição para o setor de enfermagem, mas ela não aceitou a coação e manteve a posição de se recrutar na infantaria - Foto: Reprodução
Thiago L


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Cunha revelará quem recebeu para tirar Dilma Rousseff, diz Noblat


Foto: Reprodução
 
Jornal GGN - Avançam as negociações para a delação premiada do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), que pretende atingir em cheio o presidente Michel Temer e sua cúpula de governo com ministros e aliados no Congresso. Para o jornalista Ricardo Noblat, o peemedebista revelará a lista dos que receberam propina para votar a favor do processo que derrubou a ex-presidente Dilma Rousseff.
 
Esta semana, advogados do ex-deputado estiveram na Procuradoria-Geral da República para negociar mais termos e anexos da proposta de acordo que delatará caciques do partido de Temer. As informações dão conta que os procuradores da República estão com nível de exigência alto sobre o que Cunha tem a entregar.
 
Por outro lado, Noblat ressalta que além dos nomes da então oposição e que hoje governam o país envolvidos na retirada proposital de Dilma do poder, como estratégia de barrar os avanços da Operação Lava Jato, Cunha citará as fontes pagadoras.
 
A lista de Eduardo Cunha

Por Ricardo Noblat
 
De O Globo

Parte da delação do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preso em Curitiba desde outubro do ano passado, já foi aceita pelo Ministério Público Federal. E é nela que reside a revelação que mais assombra seus ex-colegas da Câmara: a lista dos que receberam dinheiro para votar a favor da abertura do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff.

Cunha não se limitou a dar os nomes – a maioria deles do PMDB. Citou as fontes pagadoras e implicou o presidente Michel Temer. Reconheceu que ele mesmo em alguns casos atuou para que os pagamentos fossem feitos. Contou o que viu e acompanhou de perto e o que ficou sabendo depois. Não poupou nem aqueles deputados considerados mais próximos dele. Teve uma razão especial para isso.

É o troco que dá aos que antes satisfizeram suas vontades e depois o abandonaram quando mais precisou da ajuda deles.  Cunha foi do céu ao inferno num período de 17 meses. Eleito presidente da Câmara em primeiro turno no dia 1 de fevereiro de 2015 com 267 votos de um total de 513, acabou cassado no dia 12 de setembro do ano seguinte por 450 votos. Somente 10 deputados votaram por sua absolvição.

Tanto Cunha quanto o Ministério Público têm pressa em fechar acordo em torno do restante da delação. Se isso ocorrer, ela poderá servir de base para uma nova denúncia contra Temer. Ou, no mínimo, para provocar um terremoto na base de sustentação do governo no Congresso, fragilizando-o ainda mais. Temer já foi informado a respeito e reagiu com tranquilidade.




A condenação de Lula e a midiática "crítica nem-nem", por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreirra
Após a sentença de condenação de Lula pelo juiz Sérgio Moro, a TV mostrou imagens de comemorações em frente à Vara de Curitiba por manifestantes em suas indefectíveis camisas amarelas da CBF. Ao mesmo tempo, tomadas da Avenida Paulista com mais manifestantes, agora de camisetas vermelhas, faixas e punhos erguidos em protesto contra a condenação de Lula. Ato contínuo, a grande mídia expõe os rostos dos magistrados que julgarão o recurso à condenação e uma canastríssima entrevista (com signos cenograficamente saturados) do presidente do TRF-4 que poderá finalmente impedir a candidatura presidencial do líder petista. Qual a relação entre esse ensaio de volta da polarização “coxinhas X mortadelas” e o jogo midiático de sedução/chantagem com magistrados? O velho semiólogo Roland Barthes responderia: a mitologia da “crítica nem-nem”. Ou simplesmente “ninismo” -  mecanismo retórico de dupla exclusão na qual se reduz a realidade a uma polaridade simples, equilibrando um com o outro, de modo a rejeitar os dois. “Nem” um, “nem” o outro - apenas o “bom-senso”, mito burguês na qual se baseia o moderno liberalismo: a Justiça como mecanismo de pesagem que foge de qualquer embate ideológico.
Bastou o ex-presidente Lula ser condenado pelo juiz Sérgio Moro da Vara Federal de Curitiba para imediatamente a Globo News mostrar manifestantes contra e favor: alguns reunidos diante da Vara de Curitiba com as indefectíveis camisetas amarelas da CBF empunhando “pixulecos” e, diante do MASP na Avenida Paulista em São Paulo, imagens  cores vermelhas dominantes, balões da CUT e punhos fechados em apoio a Lula.
Mais tarde os telejornais repercutiram as comemorações e protestos. Não bem da forma como pretendiam. Afinal, Moro não teve coragem de colocar Lula na cadeia, frustrando a expectativa da mídia corporativa que preferiu continuar dando mais espaço ao cai-não-cai do desinterino Michel Temer.
Porém, do ponto de vista da guerrilha semiótica de retórica e propaganda, iniciado em 2013 com as “jornadas de junho”, o ato final da sentença do juiz Moro foi perfeito. Com timing, sincronismo ou, simplesmente, escárnio mesmo, a condenação de um líder trabalhista ocorreu no dia seguinte à aprovação da reforma trabalhista no Senado. 
E a dosimetria da sentença de Moro dá no que pensar: por que NOVE anos e meio de prisão? Por que não dez ou oito? Será uma irônica alusão à condenação do “nove dedos” como pejorativamente alguns se referem a Lula?
As imagens de protestos e apoio trouxeram mais uma vez à tona a polarização política que tanto marcou os confrontos em torno do impeachment da presidenta Dilma: coxinhas versus mortadelas, paneleiros versus esquerda caviar. Ou simplesmente Fla X Flu político.

De um lado, os “coxinhas” ostentando signos do bon vivant: taças com champanhe erguidas, pizzas recheadas de coxinhas e memes nas redes sociais com fotos de aperitivos e coquetéis ; e do outro, os “mortadelas” com os tradicionais signos da esquerda: bandeiras vermelhas, megafones, faixas e punhos erguidos. 

O magistrado canastrão

Ato contínuo, a máquina retórica de destruição da Globo volta seus canhões para o TRF-4 (Tribunal Regional da 4a. Região - Sul), instância  que julgará o recurso dos advogados de Lula. Agora, sob a forma de intimidação. Seguido pelo restante da grande mídia, o Jornal Nacional dedicou grande parte da sua edição do dia 13 de julho para expor os rostos e os nomes dos desembargadores. Algo assim como os cartazes de “Procurados” dos velhos filmes de western.
E uma entrevista com o presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson, com todos os signos saturados da canastrice televisual – com a câmera enquadrando ao fundo a bandeira nacional e um quadro em aquarela de um respeitável juiz togado, um martelo de juiz pousado sobre um grosso livro, cabelo emplastrado de brilhantina, uma calma estudada e sobrancelhas levantadas em soberba por posar confortavelmente em uma grande poltrona ao lado de uma estátua de bronze em clássica pose de saudação e Poder, tudo em rede nacional.
A canastrice: saturação de signos em um enquadramento cenografado
Signos saturados que conotam moderação, bom-senso, juízo, discernimento, propriedade. Mas, ao mesmo tempo, gestual com dedo em riste como que apontando para o futuro (assim como a estátua de bronze), dando uma mensagem também de força e dureza. Um enquadramento de câmera e composição de objetos de cena tão canastríssimos que parece visivelmente roteirizado, cenografado e com marcações de cena. 
Na Semiótica qualquer enunciado com tanta sobre-codificação (muitos repetição de signos  para construir uma única significação) denota intencionalidade por trás da conotação. 
Temos, portanto, em rede nacional a construção da mitologia do “bom-senso”, uma construção semiótica que legitima toda a atual judicialização da Política na qual juízes e procuradores se tornam os maiores protagonistas dos destinos políticos e econômico do País.

Barthes e a “crítica nem-nem”

Qual a relação entre essa promessa de revival da polarização coxinhas versus mortadelas e essa caprichada construção semiótica da mitologia em torno de um juiz?
O semiólogo Roland Barthes (1915-1980) responderia: a construção anterior de uma outra mitologia retórica midiática: a “crítica nem-nem” ou, simplesmente, “ninismo”.

 Em seu célebre livro Mitologias de 1957 o pesquisador francês empreende uma verdadeira engenharia reversa da retórica dos meios de comunicação de massa, cristalizada no que chamou de “mitologias”- forma de fala que não nega uma realidade, mas a torna inocente, despolitizada, ao esconder as conotações (as saturações ou canastrice das significações) dando-lhes um significado natural, eterno, imobilizando o mundo ao retirar dele a História e a contingência.
A crítica nem-nem decorre de um mecanismo de dupla exclusão – reduz a realidade histórica a uma polaridade simples, quantifica o qualitativo em uma dualidade e equilibra um com o outro, de modo a rejeitar os dois. 
Segundo Barthes, é uma figura estabelecida sobre um antigo mito burguês (o do “bom-senso”) para criar um mito no qual se baseia a forma moderna de liberalismo: a Justiça como uma operação de pesagem. E a balança só pode confrontar o mesmo com o mesmo. De uma maneira mágica, foge-se de uma realidade intolerável (porque múltipla, contingencial, histórica), reduzindo-a a dois contrários para depois serem pesados e rejeitados.
A forma retórica extrema dessa crítica nem-nem é a teratopolítica: estratégia de criação de inimigos monstruosos (morfologicamente disforme ou simulacro humano) na polarização política – sobre esse conceito clique aqui.
Mas a grande mídia deixa essa teratopolitização para os conflitos diretos entre os coxinhas e mortadelas nas ruas e redes sociais. Afinal, seus telejornais precisam usar ferramenta semióticas mais sutis, como o “ninismo”.

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